sexta-feira, 26 de junho de 2015

A Divina Comédia de Dante Alighieri - Livro Inferno Canto I


 A Divina Comédia, obra prima de Dante Alighieri é um clássico da literatura do século XVI que foi grande influência para poetas, músicos, pintores, cineastas e outros artistas nos últimos 700 anos, como Gustave Doré, Sandro Botticelli, Salvador Dali, Michelangelo eWilliam Blake iniciada, provavelmente no ano de 1307 e concluída em 1321, um pouco antes da morte do autor. Consiste em um poema fielmente simétrico, baseado no número 3. Veja o exemplo em Latim: 

1 Nel mezzo del cammin di nostra vita A

2 mi ritrovai per una selva oscura B

3 ché la diritta via era smarrita. A



4 Ahi quanto a dir qual era è cosa dura B
5 esta selva selvaggia e aspra e forte C
6 che nel pensier rinova la paura! B

7 Tant'è amara che poco è più morte; C
8 ma per trattar del ben ch'i' vi trovai, D
9 dirò de l'altre cose ch'i' v'ho scorte. C

10 Io non so ben ridir com'i' v'intrai, D
11 tant'era pien di sonno a quel punto E
12 che la verace via abbandonai. D

  
   Esta simetria foi inventada por Dante, chamada de terza rima, em latim, terça rima em português. Consiste na rima do primeiro verso com o terceiro de cada terceto, e o segundo verso rimará com o terceto seguinte. Ficando: ABA, BCB, CDC, DED. 
   Deste modo, o leitor tem a sensação de movimento, é como se o processo não pudesse ter fim. 
  Descreve a odisseia de Dante através do Purgatório, Inferno e Paraíso, é guiado no Purgatório e no Inferno pelo poeta Virgílio, e no céu por sua musa Beatriz. 





  Em um total de 100 cantos, divididos em três livros, contendo cada um 33 cantos cada (o Inferno contém um a mais), com aproximadamente 40 a 50 tercetos. Assim, trarei um Canto interpretado por semana, as frases em vermelho são minhas anotações sobre determinada palavra, o número significa  a linha da onde se encontra a palavra. 

INTRODUÇÃO:

 Pelo motivo de o poema ser um pouco complexo, farei uma introdução à primeira parte: 

  Dante, encontra-se perdido em uma floresta escura, ao tentar escapar da selva encontra uma montanha que pode ser a sua salvação, mas se depara com três feras, um pantera, um leão, e uma loba que lhe bloqueiam o caminho. Estas feras são metáforas que explicarei logo abaixo no trecho do poema. Tenta desistir, mas é impedido pelo espirito de um poeta  da antiguidade que admira, Virgílio, enviado por Beatriz, sua paixão de infância.

Divina Comédia por Sandro Botticelli
   O poeta propõe um caminho alternativo pelo centro da Terra, iniciando nos portais do Inferno, atravessando o subterrâneo até o purgatório, chegando até as portas do céu. Assim, passam por todos os nove níveis do inferno, aonde os pecadores são punidos e torturados de diversas formas.

 Leia o Canto I: 

CANTO I


Dante, perdido numa selva escura, erra nela toda a noite. Saindo ao amanhecer, começa a subir por uma colina, quando lhe atravessam a passagem uma pantera, um leão e uma loba, que o repelem para a selva. Aparece-lhe então a imagem de Virgílio, que o reanima e se oferece a tirá-lo de lá, fazendo-o passar pelo Inferno e pelo Purgatório. Beatriz, depois, o guiará ao Paraíso. Dante o segue.



DA nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa,
3 Tendo perdido a verdadeira estrada.

2. Tenebrosa: simbólica selva dos vícios humanos

Dizer qual era é cousa tão penosa,
Desta brava espessura a asperidade,
6 Que a memória a relembra inda cuidosa.


Na morte há pouco mais de acerbidade;
Mas para o bem narrar lá deparado
9 De outras cousas que vi, direi verdade.

Contar não posso como tinha entrado;
Tanto o sono os sentidos me tomara,
12 Quando hei o bom caminho abandonado.

Depois que a uma colina me cercara,
Onde ia o vale escuro terminando,
15 Que pavor tão profundo me causara.

Ao alto olhei, e já, de luz banhando,
Vi-lhe estar às espaldas o planeta,
18 Que, certo, em toda parte vai guiando.

Então o assombro um tanto se aquieta,
Que do peito no lago perdurava,
21 Naquela noite atribulada, inquieta.

E como quem o anélito esgotava
Sobre as ondas, já salvo, inda medroso
24 Olha o mar perigoso em que lutava,

O meu ânimo assim, que treme ansioso,
Volveu-se a remirar vencido o espaço
27 Que homem vivo jamais passou ditoso.

Tendo já repousado o corpo lasso,
Segui pela deserta falda avante;
30 Mais baixo sendo o pé firme no passo.

Eis da subida quase ao mesmo instante
Assoma ágil e rápida pantera
33 Tendo a pele por malhas cambiante.

32. Pantera: símbolo da luxúria e da fraude, politicamente, de Florença 

Não se afastava de ante mim a fera;
E em modo tal meu caminhar tolhia,
36 Que atrás por vezes eu tornar quisera.

No céu a aurora já resplandecia,
Subia o sol, dos astros rodeado,
39 Seus sócios, quando o Amor divino um dia

A tais primores movimento há dado.
Me infundiam desta arte alma esperança
42 Da fera o dorso alegre e mosqueado,

A hora amena e a quadra doce e mansa.
De um leão de repente surge o aspecto,
45 Que ao meu peito o pavor de novo lança.

44. Leão: símbolo da soberba e da violência; politicamente, da França



Que me investisse então cuido inquieto;
Com fome e raiva atroz fronte levanta;
48 Tremer parece o ar ao seu conspeto.

Eis surge loba, que de magra espanta;
De ambições todas parecia cheia;
51 Foi causa a muitos de miséria tanta!


49. Loba, símbolo da avareza e da incontinência; politicamente da Cúria Romana


Com tanta intensa torvação me enleia
Pelo terror, que o cenho seu movia,
54 Que a mente à altura não subir receia.

Como quem lucro anela noite e dia,
Se acaso o tempo de perder lhe chega,
57 Rebenta em pranto e triste se excrucia,

A fera assim me fez, que não sossega;
Pouco a pouco me investe até lançar-me
60 Lá onde o sol se cala e a luz me nega.

Quando ao vale eu já ia baquear-me
Alguém fraco de voz diviso perto,
63 Que após largo silêncio quer falar-me.

62. Alguém etc., o poeta Virgílio Maro, símbolo da razão humana. 

Tanto que o vejo nesse grão deserto,
— “Tem compaixão de mim” — bradei transido —
66 “Quem quer que sejas, sombra ou homem certo!”

“Homem não sou” tornou-me — “mas hei sido,
Pais lombardos eu tive; sempre amada
69 Mântua lhes foi; haviam lá nascido.

“Nasci de Júlio em era retardada,
Vivi em Roma sob o bom Augusto,
72 Quando em deuses havia a crença errada.

“Poeta, decantei feitos do justo
Filho de Anquíses, que de Tróia veio,
75 Depois que Ílion soberbo foi combusto.

“Mas por que tornas da tristeza ao meio?
Por que não vais ao deleitoso monte,
78 Que o prazer todo encerra no seu seio?”

“— Oh! Virgílio, tu és aquela fonte
Donde em rio caudal brota a eloqüência?”
81 Falei, curvando vergonhoso a fronte. —

“Ó dos poetas lustre, honra, eminência!
Valham-me o longo estudo, o amor profundo
84 Com que em teu livro procurei ciência!

“És meu mestre, o modelo sem segundo;
Unicamente és tu que hás-me ensinado;
87 O belo estilo que honra-me no mundo.

“A fera vês que o passo me há vedado;
Sábio famoso, acude ao perseguido!
90 Tremo no pulso e veias, transtornado!”

Respondeu, do meu pranto condoído;
“Te convém outra rota de ora avante
93 Para o lugar selvagem ser vencido.

“A fera, que te faz bradar tremante,
Aqui passar não deixa impunemente;
96 Tanto se opõe, que mata o caminhante.

“Tem tão má natureza, é tão furente,
Que os apetites seus jamais sacia,
99 E fome, impando, mais que de antes sente.

“Com muitos animais se consorcia,
Há-de a outros se unir té ser chegado
102 Lebréu, que a leve à hórrida agonia.

“Por ouro ou por poder nunca tentado
Saber, virtude, amor terá por norte,
105 Sendo entre Feltro e Feltro potentado.

“Será da humilde Itália amparo forte,
Por quem Camila a virgem dera a vida,
108 Turno Eurialo, Niso acharam morte.

“Por ele, em toda parte, repelida
Irá lançar-se no infernal assento,
111 Donde foi pela Inveja conduzida.

“Agora, por teu prol, eu tenho o intento
De levar-te comigo; ir-te-ei guiando
114 Pela estância do eterno sofrimento,

“Onde, estridentes gritos escutando,
Verás almas antigas em tortura
117 Segunda morte a brados suplicando.

“Outros ledos verás, que, em prova dura
Das chamas, inda esperam ter o gozo
120 De Deus no prêmio da imortal ventura.

“Se lá subir quiseres, um ditoso
Espírito, melhor te será guia,
123 Quando eu deixar-te, ao reino glorioso.

122. Espirito melhor, Beatriz, a mulher que Dante amou

“Do céu o Imperador, a rebeldia
Minha à lei castigando, não consente
126 Que eu da cidade sua haja a alegria.

“Em toda parte impera onipotente,
Mas tem no Empíreo sua augusta sede:
129 Feliz, por ele, o eleito à glória ingente!”

— “Vate, rogo-te” — eu disse — “me concede,
Por esse Deus, que nunca hás conhecido,
132 Porque este e maior mal de mim se arrede.

“Que, até onde disseste conduzido,
À porta de São Pedro eu vá contigo
E veja os maus que houveste referido”.

136 Move-se o Vate então, após o sigo.

   Se gostou, siga o blog para não perder os cantos seguintes, que será postado na próxima semana. Compartilhe com seus amigos, eu ficaria agradecido. Até outro encontro.

Cantos seguintes:
Canto II

2 comentários:

  1. João Muito boa a sua iniciativa. Estarei acompanhando seu trabalho.

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    1. eu agradeço o elogio, até agora já foi publicado até o canto V se tem interesse

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